sábado, 20 de setembro de 2008

coisas escritas... e o regresso marcado!

Há muito que não dou notícias... os dias têm sido bala-bala, com muito para fazer, muito para resolver... hoje o dia não está particularmente feliz, não revi os textos que vou postar (peço desculpa por erros, gafes, gralhas...)... mas como a net na cidade vai de mal a pior, aproveitei esta vinda ao Bom-Bom para dar notícias. AHHHHH!!! E ACHO QUE AINDA NÃO DISSE, DIA 23 DE OUTUBRO ATERRO EM PORTUGAL!

Segunda-feira escrevi assim…
Iogurte com belra… delicioso pequeno-almoço depois de uma corrida, de uma hora, por caminho de mato. Hoje o dia amanheceu com bastante calor, agora, às 9h, já está a arrefecer – naturalmente um arrefecer relativo, visto que estou de t-shirt e saia e sinto-me muito bem. Mas às 6h estava calor e, por isso, fui correr quase até ao Picão, uma localidade pequenina do lado direito quem sobe da cidade para o Aeroporto, mais ou menos 15 minutos de carro. Desliguei o mp3 e fui correndo ao som dos pássaros, que muito atarefados andavam. Ainda na cidade assisti ao pequeno-almoço de dois papagaios que se deliciavam com uma flor junto à caravela, a discoteca ao lado de casa. E é assim que tenho começado alguns dos meus dias, aproveitando o cedo e rápido amanhecer da ilha, levanto-me, deixo a ronha e vou correr uma hora, sabe muito bem e assiste-se à azáfama de uma cidade que umas horas depois volta à sua calmaria, à sua pacatez de sempre. Engraçado… com os pássaros acontece o mesmo, se for agora correr poucos se vêem a voar ou até mesmo a grasnar e piar.
Por aqui, no Centro, a azáfama está agora a começar e até às 15h não pára, e eu também não… mas eu não paro até à noite. Há sempre coisas a fazer, coisas para fazer, pessoas para atender, “fogos” para apagar, gente a ajudar. O morar no próprio centro faz-me trabalhar 24 sobre 24 horas, e, por isso, ontem fui passar o dia ao aeroporto! 6h da manhã, antes que alguém me tentasse “prender” fugi para o aeroporto, que é uma localidade, como o próprio nome indica, junto ao aeroporto. Ovos estrelados e banana-pão frita para o pequeno-almoço (nem imaginam como é bom, tão bom quanto pouco saudável), conquistada a confiança da Zinha e do Leo passeio e chuva. Ver televisão, conversar, molhas e ir à casa de banho no mato. Dia delicioso longe de tudo o que tem a ver com trabalho, longe de casa… vá… a 15 minutos de casa. São as distâncias daqui!
E os dias têm sido cheios de gente, de alegrias e preocupações e, quando tudo corre bem, quando todos se conseguiram organizar, quando tudo está dentro de horas… madeira (árvore) caída no meio do caminho e lá se tem de sair com o machim e cortar, cortar, cortar para conseguir passar.
E os dias vão sendo assim passados, já com a ânsia de chegar a Lisboa, deixar o Príncipe e, depois, São Tomé. Com as saudades a emaranharem-se sem as saber distinguir de onde vêm e para onde vão, onde ficam, perseguem-me e fazem-me sentir perdida. Dois mundos que são a minha casa… apetece ir, apetece ficar, e as saudades crescem e apertam!


E quinta-feira escrevi assim…
a net na cidade está um problema. Até mesmo na CST, a Companhia Santomense de Telecomunicações, apesar de eles (Mendinho, nome de casa de Julay, e Arruá, meus amigos que lá trabalham) apregoarem que têm uma net excelente e ultra rápida… como sei que vou ao Bom-Bom logo, desato a escrever…
Como devem ter visto nas notícias, o Thérese, um dos 3 barcos que faziam a travessia marítima entre as ilhas, foi ao fundo. Faziam, porque agora ficou só o Tornado. O África 1, depois de ter estado à deriva e perdido, voltou a encontrar-se, e sim, reflexivo porque foram eles que se “encontraram” e conseguiram dizer onde estavam, mas já sem qualquer condição para navegar. E o Thérese foi ao fundo… dez mil litros de Gasóleo em vez dos habituais quinze mil, carga mal arrumada, excesso de passageiros, e uma casquinha de noz ao fundo com pessoas e mercadorias.
Uma tragédia… e como se vive uma tragédia destas numa ilha que vê o quinto navio a afundar em 10 anos, em que o último foi à menos de 2 anos e do qual poucos foram os salvos e a maioria dos mortos foram crianças? Numa ilha que se sente abandonada pela ilha “mãe”, numa ilha sem marinha e com pescadores ainda desaparecidos? Terça à noite estava a ver o Sporting e ouviu-se o “zum zum” que o Thérese estava a afundar. O futebol passou e o “zum zum” também, pouca importância se deu e a informação era ainda de boca em boca. Dormiu-se e quarta de manhã, na minha saída para correr, vi muita gente. Muita gente na rua. Gente parada. Sentados, olhando o vazio, olhando a baía, apenas uma mulher chorava… perguntei sobre o Thérese. As informações eram díspares. “ninguém se salvou”, “não chegou a afundar”, “14 desaparecidos e 2 mortos, no hospital”, “todos salvos”… e as esperanças são vãs e poucas, esta gente está habituada às perdas no mar, já viu muitos naufrágios. Espera-se que a energia chegue e, atentamente, ouvem-se os debates na ONU, a subida do preço do petróleo, a crise no Cáucaso… até chegar a hora do Thérese. Continuam difusas… e até hoje não se sabe ao certo quem ia no barco, quem não ia. 24 era a lista dos passageiros, mas há quem diga que eram 27, 31 pessoas foram salvas, nenhuma morreu no hospital, e a dor é a mesma, não passa, mas a ilha continua no seu viver, na sua serenidade, na sua dor de quem vê 5 famílias (5 pessoas da mesma família) serem engolidas pelo mar, crianças, que clandestinamente se tinham infiltrado, com a esperança de a tempo chegarem para o início das aulas, padecerem e os mantimentos, o gasóleo, que para os veículos já não há e que para a energia em breve acabará. O arroz, o leite… e todas aquelas pequenas coisas materiais que até julgamos grave chorar, mas que para quem não as tem, para quem sente o aumento de preço das coisas a cada chegada do barco, para quem sem nada fica, chorar é a única maneira de gritar, de expulsar a dor, a revolta de ouvir governantes dizerem que as responsabilidades vão ser apuradas, e é certo que todo o processo termina assim, com este discurso hipócrita. É a sua única luta lícita. E o Porto joga, o Real Madrid passa na TVS e… a vida contínua, afinal não se sabe quando o Petrônio, vilão da novela das 19h, vai ou não ser desmascarado. A televisão dói menos…

Entretanto… hoje chegou o Osvaldo, coordenador dos projectos, da Santa Casa, na Trindade, e meu amigo. Dar uma mãozinha na organização, ensinar, partilhar experiências e saberes de quem já “anda” nisto há alguns anos.
Na 3ª feira fizemos bolo para o pequeno-almoço de quarta e a massa estava óptima…



Bolo de Foster, uma marca de sumo em pó, porque estamos em contenção de despesas. O leite está um "balúrdio"!


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